29 de dezembro de 2010

Espelho partido, sete anos de azar.


Tenho medo.
Medo de não sair deste abismo ao qual me encontro.
Acordo e procuro pelo sol, mas me deparo com a escuridão, a penumbra. Meus olhos mal se abrem.
Minhas pupilas dilatam-se à procura de luz, mas há falta de esperança.
Tento escalar as grutas que se ergueram sobre mim. Mas, ao final do dia, acabo caindo.
Minhas garras já não se encontram como dantes.
Minha saúde não corresponde às minhas vontades.
Qualquer hesitação se encontra esmagada.
Ralo-me em cada deformação pontiaguda que escorrego.
Rasgo a epiderme, restando-me apenas marcas desconhecidas... até, finalmente, estalar-me no chão.
Não se assustem com a dor, quase não faz barulho. Apenas ecos de sentimentos.
Um fino e estridente gemido, quase imperceptível aos ouvidos alheios, que andam tão distantes.
O fundo parece-me sem fim e caio, cada vez mais. Mais longe de mim.
Ralando-me, rasgando-me, estalando-me.
Meu corpo assemelha-se a um espelho partido.
Cada sorriso é pela metade. Cada olhar é em partes.
Para cada gesto meu toque se torna mais e mais leve.
Meus pés já não caminham juntos. Descaminham.
É uma mistura de cartas, de peças, um hibridismo puro entre o querer e o poder.
Entre a harmonia e o desespero.
Aos poucos, junto cada pedaço.
Aos poucos, tento reconstruir-me.
Sei que nada é como antes.
Será apenas um remendo.
Mas todo remendo, por ser distinto do que era, originará um novo eu.
Um espelho completo ei de descobrir em mim, com luzes eternas ao meu redor.
Inteira serei.

(Mariana Lopes)

23 de dezembro de 2010

Sobrenome

O Ultra-romantismo sempre se fez meu sobrenome.
Não pela ânsia da morte ou pela satisfação que esta poderia trazer aos meus devaneios.
Porém, pela atração ao lirismo da liberdade.
Pelo apego aos sentimentos mais profundos sem exitação de serem usufruídos, sem a cautela de serem duvidosos.
Sim, pela realeza da profundeza.
Pela profundeza do ser.
Pela profundeza do amar.
Pela profundeza de viver.
Pela profundeza de se doar.
Pelo puro e extremado exagero.
Sei que tempo nós temos,
A água é que corre , o rio continua lá.
Mas tenho a urgência em sentir, em querer.
Em te querer.
Ei de me purificar de tamanha demasia.
Derramá-la-ei em ti.
Não por meio de meu cândido toque ou pelo fulgor de minhas carícias ou pelo meu transvestido romantismo.
Mas pela intemperância de alimentar meu vício.
Mas pela minha ânsia em te manter eternamente presente em minhas lembranças.
Fixado na minha teimosia em aceitar as encruzilhadas do destino.
Fixado em mim, ei de estar profundamente.
No sobrenome de cada recordação, de toda lembrança revivida.
Ei de estar.
(Mariana Lopes)

21 de dezembro de 2010

Lembranças


Ao assistir a um filme cujo personagem principal é Robert Pattinson, comecei a meditar sobre certos preceitos. Se seguirmos a mensagem do filme , o sub título já a responde: “A vida é feita de momentos”. Sim, a vida é um filme terminável , feito de cenas, personagens e um final.
Não me perguntes se a vida é um filme com final feliz, pois isso, sinceramente, eu não saberei responder, quiçá tenha alguém que saiba.
Porém, assim como diria Shakespeare : “A vida é uma peça de teatro sem ensaios.”
Isso é o que me parece mais difícil de lidarmos.
Sonhamos com final felizes, fazemos planos, opções . Todavia, por mais que saibamos que nossa vida é única, que não se banha duas vezes no mesmo rio, insistimos em delinear mentalmente que nossas escolhas têm volta . Somos insistentes conosco.
Não. Elas não têm e culminarão sempre em uma perda. São fatais.
A própria forma como se vive consiste em uma escolha: ou se vive com parâmetros, projetos para o futuro ou se deixa levar pelas sensações momentâneas.
É tudo uma questão de viver.
“Cada qual com o seu cada”, cada qual com sua vida, cada qual com os seus motivos.
Convenhamos, o que me impressionou nesse filme- estilo sessão da tarde- não está atrelado ao ator por fazer parte da saga Crepúsculo. Não sou nenhuma fã alucinada, por favor.
No entanto, confesso que o personagem me agradou, identifiquei-me com ele. Pelo seu jeito intrínseco, com poucos amigos, isolado pela pleura de seus pensamentos, com uma bela queda por livros, sem muitas expectativas para cada dia, aposentado de qualquer experiência nova, mas que acaba caindo em buracos por pura distração, por pura brincadeira do destino.
Teve a sorte de nunca escorregar em orifícios profundos; mas em sentimentos reentrantes que sempre o cercava. Como se o seu eu fosse um saco descosturado onde carregasse todas as emoções sem se queixar: as dele, as de sua namorada, as de sua irmã, as de seu amigo.
Justificado como um coração nobre, generoso.
Além de ser atraído por deuses gregos , pela balança da justiça, pela lembrança de cada pessoa que cravou a sua vida. Possui peculiaridades não muito expressivas, na realidade, pouco compreendidas, pois as pessoas preferem os extrovertidos, afinal, dão o mundo para explicitar a todos o que se sentem. Não, Tyler Roth, não era destes. Era fechado em si, em seus escritos. Era intenso.
Felizes os que tiveram a sorte de entrar em sua vida, de senti-lo.
Pois o que mais moveria um coração generoso senão o amor?
Sim. Ele era feito de puro amor.
Bom, assim como na vida, o filme terminou com a penumbra. Seus olhos se fecharam devido a um fenômeno americano.
Todos indagarão, ele não devia estar lá , é tudo culpa de seu pai.
Sim, ele devia estar.
O espetáculo da vida vai até o final da linha, nunca se para no meio da peça.
O fim é sempre o fim.
Para concluir, além de comentários escrupulosos, além de citações literárias, eu não poderia terminar o texto sem deixar como ditame a frase mais célebre do filme:
“Qualquer coisa que você faça na vida será insignificante, mas é muito importante que o faça porque ninguém mais o fará”. (Gandhi)

É mais que uma frase, é uma teoria. Viva!



Acabou a linha.
(Mariana Lopes)

17 de dezembro de 2010

La justificación de la soledad


- ¿Por qué sólo esos?
- Mi sombra me hace compañía.
- Y los demás?
- Yo prefiero creer que no me ha visto por aquí.
(Mariana Lopes)

6 de dezembro de 2010

Armação dos Deuses

Havia uma moça , seu nome era Jadfs. Vivia em Neápolis, na Grécia.
Seus pais, mais velhos, viam-na como um tesouro que cintilava em suas vidas. E ,como toda pedra preciosa é possível de se partir com uma leve queda, eles deviam mantê-la presa. Isso, presa. Para que ninguém a cobiçasse nem a tocasse.
E, assim, fizeram.
Em um cômodo, no fundo do quintal , prenderam Jadfs com finas cordas . Não era preciso muitos equipamentos para segurá-la, era tão inocente que linhas de tecido prendiam seus dedos a fio.
Ela cresceu . As cordas curvavam-se conforme os contornos de seu corpo, mas ainda continuavam suficiente para mantê-la presa segundo a tranqüilidade de seus genitores. Segura de qualquer ser estranho que pudesse detê-la.
Tinham medo que se machucasse, que se iludisse, que amasse.
Esta menina, esta garota, esta moça,esta mulher –ora, podia ser denominada como tal, pois ela já não tinha a mesma inocência desde de que surgiu do ventre materno, a lei da natureza torna-nos adultos, mesmo quando crescemos contra o próprio destino- esta aí, não conhecia o mundo.
Seu mundo era o seu próprio pensamento,a sua própria imaginação. O único ser que conhecia era o celeste Sol, sua eterna admiração. Até da Lua a privavam, afinal, ao entardecer, era hora da criança dormir. Lobisomens perambulam pela noite.
Num dia, como outro qualquer, ou melhor, era para ser como outro qualquer. Seus pais saíram pela manhã, foram à missa como de costume do domingo e lá ficou Jadfs, como também de costume, acompanhada consigo mesmo naquela jaula . Naquela jaula daquela casa. Aquela Casa como tantas outras. Naquela Cidade, Neápolis, como tantas outras.
Porém, aquela Cidade não era de um país como tantos outros, pertencia ao país de raízes mitológicas. E o que ninguém desconfiava era que aquele ser preso pelas forças familiares, tinha um destino livre. Ao nascer, os deuses a consagraram e Afrodite, deusa da beleza e do amor, a reincorporou na noite de seu nascimento durante o encontro de Vênus com a Lua.
Mas quem é que se preocupa com seres astrológicos?
As pessoas vivem enquadradas em seus próprios preceitos e em suas próprias verdades, ditas verdadeiras.
Enfim, nesse dia, um caixeiro viajante metido a poeta passeava pela cidade , pedia comida, abrigo, mas continuava só, com sua própria sombra. Bateu palma na casa de Jadfs, ninguém atendeu e ,sem saber o porquê, insistiu nas palmas. Nada.
De repente , ouviu um som diferente que lhe despertou um sentimento desconhecido e, sem dar por si, atravessou o jardim, como um invasor inexperiente .
Apenas, guiado pelo som .
Encontrou o cômodo, o cômodo que estava Jadfs e seus olhos se cruzaram por uma fresta de madeira descascada. Vislumbrado ele ficou. Afinal, os olhos dela refletiam toda a transparência de um ser esquecido, de um ser cheio de vida, de amor, de esperança...de sonhos.
Quando percebeu, havia se passado horas e horas e seus olhos não se desencontravam. Foi o barulho do motor do carro vindo da igreja que os despertaram daquela súbita sensação. Ele se apressou e correu pela rua a desaparecer, porém, seu coração já estava preso, não pelas cordas de Jadfs, mas pelo encanto de seu olhar.
Uma paixão oculta, já iniciada.
Depois daquele dia, ela definitivamente deixara de ser aquela menina iludida, ela conhecera algo mais que o Sol. E ,assim, todos os domingos pela manhã, seus olhos passaram a ter um encontro sagrado , armado pelos Deuses.
Com o decorrer do tempo, seus pais até desconfiaram de algo, mas as emoções ,geralmente, passam despercebidos por aqueles que vivem com a objetividade do dia-a-dia, há coisas que estão distantas de qualquer aparência, qualquer superfície, é muito mais intrínseco.
Aqueles encontros pela fresta tornaram-se insuficiente, seu ego pedia mais emoções, pedia outro ar,o ar daquele que a esperava pelo lado exterior. A partir desse momento, aquelas finas cordas, tornaram-se finas demais e , durante uma noite -o horário proibido para qualquer criança- enquanto seus pais dormiam serenamente confiantes na presa, ela desamarrou com seus delicados dedos cada nó delineado em seu corpo.
Confesso que seus olhos estranharam aquela escuridão sombria da noite, mas havia o brilho das estrelas, ademais, o olhar conhecido a esperava.
Naquela noite, a Lua encontrou-se novamente com Vênus, e o amor e toda beleza de uma paixão despejados por Afrodite foram desfrutados. A lei da natureza foi obedecida, a lei dos deuses festejada.
Eras mulher, eras amante, eras amada.
Nenhuma corda, nenhuma prisão, nenhuma armadilha pode afrontar ao destino.
Nenhuma corda, nenhuma prisão, nenhuma armadilha, nenhum genitor pode afrontar ao amor.
Quando voltou ao alento pela manhã com toda a coragem para iniciar a sua vida, a sua vida, não a vida que haviam planejado. Seus pais a esperavam horrorizados, mas preparados, armados.
Agora as cordas eram muito mais grossas, havia armadilhas espalhadas canto a canto, qualquer fresta foi tapada. As flores que adornavam o cômodo foram substituídas por cadeados.
E o seu ego que ,antes, fazia-se de coragem, estava repleto de dor, decepção, mágoa.
Lágrimas atrapalhavam o encanto resplandecente de seu olhar.
E o que aconteceria agora?
Ela conseguiria desamarrar-se?
Ele a resgataria?
Seus pais se redimiriam?
Jadfs só queria uma resposta de seu destino.
Porém, uma certeza ela tinha, os deuses a ajudariam. Todo seu amor , sua beleza foi consagrada para aquele olhar, para aquele homem, para aquele viajante desconhecido.
Nenhuma corda, nenhuma prisão, nenhuma armadilha pode afrontar ao destino.
Nenhuma corda, nenhuma prisão, nenhuma armadilha, nenhum genitor pode afrontar ao amor.
(Mariana Lopes)